Após o término da atividade física, o consumo de oxigênio permanece elevado por vários minutos ou até mesmo horas dependendo da intensidade, volume e tipo do exercício (Binzen et al., 2001; Burleson et al., 1998; Thornton et al., 2002, Elliot et al., 1992). Este fenômeno é conhecido como consumo excessivo de oxigênio pós-exercício (EPOC, do inglês excess post-exercise oxygen consumption), e pode ser atribuído às alterações ocorridas em diversos mecanismos fisiológicos, como temperatura corporal, taxa ventilatória, níveis hormonais, atividade cardíaca, reabastecimento dos estoques de ATP-CP, reposição de oxigênio na circulação e no músculo, oxidação de lactato, ressíntese de glicogênio, bomba de sódio-potássio (Bahr et al., 1992; Haltom et al., 1999), maior concentração de catecolaminas, presença de cortisol, aumento no metabolismo dos ácidos graxos, lesão muscular induzida pelo exercício (Gaesser e Brooks, 1984; Dolezal et al., 2000), entre outros.
Treino de força x Aeróbio
Na tentativa de avaliar o EPOC em diferentes tipos de atividades, diversos estudos têm confrontado o treinamento de força com o exercício aeróbio (Drummond et al., 2005; Braun et al., 2005; Burleson et al., 1998; Crommett e Kinzey, 2004).
Nos exercícios aeróbios, a magnitude e a duração do EPOC parecem depender diretamente da intensidade e da duração da sessão de treinamento. Por exemplo, intensidades com 50-80% do VO2máx por 5-20 minutos não têm gerado EPOC por mais de 35 minutos. No entanto, quando o treino é realizado com intensidades próximas ao limiar ventilatório por 20-40 minutos, o EPOC tem uma duração maior, mas dificilmente excede 40 minutos (Borsheim e Bahr, 2003).
Agora, ao analisar o treinamento de força, a resposta do EPOC se apresenta bastante variada. Provavelmente em decorrência de uma maior combinação de intensidade, volume, velocidade de execução, intervalo entre as séries, forma de execução e ordem dos exercícios, entre outras variáveis (Meirelles e Gomes, 2004; Matsuura et al., 2006; Neto e Farinatti, 2009). Neste sentido, pesquisadores relatam que esse tipo de atividade pode proporcionar um EPOC com duração de 30 minutos a 38 horas, ou mesmo dias, dependendo do protocolo utilizado (Burleson et al., 1998; Schuenke et al., 2002; Neto e Farinatti, 2009).
Braun et al. (2005) compararam a corrida em esteira rolante (85% da frequência cardíaca máxima) com três séries de circuito (15 repetições a 65% de 1RM) e encontraram EPOC significativamente maior durante os 30 primeiros minutos de recuperação no grupo que realizou o treinamento de força. No entanto, em um estudo anterior, Crommett e Kinzei (2004) não encontram diferenças significativas no EPOC, entre três séries de 8-12 repetições com 70% de 10RM e 12 minutos de ciclo ergômetro a 60/65% do VO2máx. Apesar das divergências nas pesquisas citadas acima, a maioria dos estudos sugere que o treinamento de força produz maior duração e magnitude do EPOC que os exercícios aeróbios (Burleson et al., 1998; Gillette et al., 1994, Drummond et al., 2005 ).
No estudo de Burleson et al. (1998), por exemplo, jovens treinados foram submetidos a duas diferentes sessões de exercícios. 1) Treinamento de força em forma de circuito: duas séries de oito exercícios com 60% de 1RM durante 27 minutos. 2) Exercício aeróbio: caminhada com VO2 médio equivalente a 44% do VO2máx e duração de 27 minutos. O objetivo da pesquisa foi verificar possíveis diferenças entre os EPOCs em 90 minutos de análise. Na conclusão do estudo, os resultados demonstraram maior magnitude do EPOC na sessão de treinamento de força. Os autores sugeriram que o fato desse tipo de atividade envolver grupamentos musculares diversos, em ambos os segmentos corporais, houve uma maior necessidade de VO2 para restaurar o estresse gerado ao organismo.
Drummond et al. (2005) também encontraram uma maior magnitude do EPOC no grupo que realizou o treinamento de força. No entanto, os protocolos utilizados foram diferentes. Oito exercícios com 70% de 1RM e um minuto e 45 segundos de intervalo entre as séries contra 25 minutos de corrida a 70% do VO2máx.
Com relação às diferentes combinações do treinamento de força, Thornton e Potteiger (2002) compararam alta intensidade (duas séries de circuito com oito repetições a 85% de 8RM) com baixa intensidade (duas séries de circuito, com 15 repetições a 45% de 8RM), ambos com 60 segundos de intervalo entre as séries. Os resultados revelaram que o exercício realizado com maior intensidade gerou um maior EPOC em todos os tempos estudados (20, 60 e 120 minutos), mesmo com igual gasto calórico.
Além da intensidade, a duração do intervalo de descanso entre as séries do treinamento de força também pode proporcionar diferentes respostas no EPOC. Ronald et al. (1999) compararam intervalos de 20 segundos e de 60 segundos entre duas séries de 20 repetições de oito exercícios com 41,4% de 1RM em forma de circuito. No final do estudo, os maiores valores do EPOC foram encontrados no grupo que utilizou o menor intervalo de recuperação.
Treinamento concorrente
O treinamento concorrente consiste em realizar treinamento de força e exercício aeróbio em uma mesma sessão. Esse tipo de proposta tem gerado alguns questionamentos, principalmente em relação à ordem de sua execução. Qual dos dois exercícios deveria ser realizado primeiro? Qual seria a melhor ordem de acordo com determinado objetivo? Com relação ao EPOC, realizar o treinamento de força depois do exercício aeróbio tem sido considerado mais eficiente (Lira et al. 2007; Drummond et al. 2005).
Gasto calórico após o treinamento de força
Lira et al. (2007), ao avaliar o treinamento concorrente, encontraram um gasto calórico médio acima do valor de repouso de 15 kcal, 30 minutos após o exercício. A sessão de treino consistiu em realizar três séries de 12 repetições em 4 exercícios com 70% de 1RM, depois de 30 minutos de aeróbio, realizado em esteira rolante numa intensidade de 90% da velocidade correspondente ao limiar anaeróbio. Já a ordem inversa, treinamento de força antes do aeróbio, o gasto calórico foi de 13 kcal.
Em outro estudo, Thornton e Potteiger (2002) utilizaram duas séries de nove exercícios com 8RM e um minuto de intervalo. Os resultados demonstraram um EPOC com 20 minutos de duração, o equivalente a 11 kcal de gasto calórico acima do valor de repouso.
Em um estudo mais recente, Ormsbee et al. (2007), após um treinamento em forma de circuito com três séries de 10 RM em 10 exercícios, encontraram uma magnitude do EPOC de 10 kcal em 45 minutos de duração.
Crommett e Kinzey (2004), ao testarem o treinamento de força, encontraram uma magnitude do EPOC um pouco maior que os dois estudos citados acima. Aproximadamente 67 kcal em 60 minutos, depois de três séries com carga para 10RM e intervalos de recuperação de um minuto, em cinco exercícios.
Já Burleson et al. (1998) avaliaram o EPOC em dois tipos de protocolos: 1) Duas séries de oito exercícios a 60% de 1RM em forma de circuito com VO² médio equivalente a 44% do VO2máx em 27 minutos de treino. 2) Corrida com mesma intensidade e duração do treinamento de força. Após 30 minutos de análise, os pesquisadores verificaram um gasto calórico de 95 kcal no treinamento de força contra 64 kcal do exercício aeróbio. Vale destacar que dos estudos citados neste texto, esse foi o que relatou a maior magnitude do EPOC.
Conclusões
A magnitude e a duração do EPOC mostraram-se maiores no treinamento de força no que no exercício aeróbio.
Quanto maior a intensidade e a duração do treinamento, maior serão a magnitude e a duração do EPOC.
Ao avaliar a ordem do treinamento concorrente, a magnitude do EPOC mostrou-se maior quando o treinamento de força foi realizado após o exercício aeróbio.
Mesmo com protocolos parecidos, vários estudos apresentaram EPOC diferentes. O que torna difícil definir qual protocolo seria mais eficiente.
Ao analisar as calorias gastas durante EPOC, podemos concluir que os valores são pouco expressivos no tocante ao balanço energético negativo.
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FONTE: Gease