Exercícios sem orientação de jovens traz sérios prejuízos à saúde

A busca por saúde e bem-estar tem levado um número cada vez maior de jovens e crianças às academias. Os pais se preocupam: é possível que um adolescente tenha a mesma rotina de malhação de um adulto? Especialistas alertam para o perigo do exagero da musculação feita sem acompanhamento especializado. Julian Machado, ortopedista especializado em medicina esportiva e reabilitação, explica que as lesões causadas pela musculação (veja quadro) estão ligadas principalmente à falta de orientação e acompanhamento, provocadas por intensidade de exercícios e cargas incompatíveis com a idade, escolha errada de exercícios e equipamentos ou falta de período de adaptação adequado. Essas lesões afetam ossos, articulações, ligamentos e músculos, podendo interferir inclusive no crescimento do jovem.

“Qualquer atividade física se torna perigosa quando é feita sem critérios, desde o futebol de fim de semana aos exercícios de alongamento ou abdominais. O adolescente pode fazer musculação? Pode, desde que um profissional avalie a necessidade do exercício e a forma como será feito”, explica Julian. O profissional ressalta que, quando bem orientada, a musculação pode se tornar um estímulo ao crescimento, um meio de prevenção de doenças ligadas ao sedentarismo e à obesidade, uma forma de desenvolver maior resistência física, mais força e performance muscular elevada, além de fortalecer as articulações e colaborar para o desenvolvimento ósseo.

Academias especializadas oferecem treinamento especial para os mais jovens. Para eles, as opções são variadas: esportes, atividades lúdicas para bebês e até introdução à musculação para quem tem mais de 10 anos. “Quando feita com acompanhamento, a prática de atividades físicas especializadas e direcionadas auxilia na fase de crescimento das crianças, melhora sua autoestima e estimula o gosto pelo bem-estar. Dessa forma, tanto o esporte quanto o exercício de musculação podem ser executados também pelo adolescente, desde que uma série de cuidados sejam observados”, ressalta o especialista.

Rafael Zveiter da Nóbrega, 9 anos, frequenta academia semanalmente. “Pedi para a minha mãe me matricular em alguma aula”, conta Rafael. A mãe, Adriana Zveiter, 41, conta que as aulas de condicionamento — realizadas com o auxílio de um personal trainer — ajudaram Rafael a recuperar a autoestima e a confiança, além de lhe dar mais disposição e maior qualidade de sono. “Tive receios de que levar o Rafael para a academia pudesse ser perigoso, afinal, ele ainda é muito novo. Busquei orientação e me informei sobre os exercícios que ele faria. Fiquei tranquila. Posso ver o resultado, vejo como é importante que desde cedo ele entenda a necessidade de cuidar da saúde sem se sentir dependente de padrões de beleza”, conta. Rafael faz duas vezes por semana um circuito de uma hora de exercícios, que estimulam o crescimento, o aumento da força muscular e a queima de gordura.

“As respostas dos organismos de uma criança e de um adolescente ao exercício são diferentes das de um organismo adulto”, explica o educador físico Dirceu Lobo, especialista em fisiologia do exercício. “Portanto, é importante adequar a intensidade da atividade física para que ela não prejudique o crescimento desse jovem”, afirma. As atividades físicas de condicionamento e força livres (quando o indivíduo tem liberdade de malhar na academia sem horário predefinido e sem a presença integral do orientador físico) são indicadas para jovens com mais de 14 anos. No entanto, algumas academias já oferecem acompanhamento personalizado para quem está na faixa dos 11 aos 14 anos. “A diferença, nesses casos, é do modelo da aula. O professor acompanha os alunos de forma individual e os exercícios são aplicados em intensidades e tempos menores, o que possibilita a musculação. Isso só é viável devido ao acompanhamento especializado e direcionado, a depender da idade do indivíduo”, avalia Julian Machado.

Presença dos pais
Para a pediatra Ilma da Cunha Barros, duas coisas são essenciais para que os jovens comecem a praticar musculação. “Na infância e na adolescência, a pessoa vai precisar de acompanhamento contínuo dos pais para que a qualidade do exercício seja avaliada”, prega. Para ela, iniciar o hábito de exercícios pesados com o objetivo de ganho de músculos pode desencadear prejuízos ao crescimento, lesões musculares e danos posturais sérios. “É preciso ter em mente que a musculação não é proibida. O importante é compreender que ela deve ser feita de acordo com os limites do jovem, diferente de um adulto. Impor sobrecarga de peso a um corpo que ainda não está preparado pode ser perigoso.”

A médica explica também que a presença dos pais é essencial para esclarecer aos adolescentes sobre os perigos da busca inalcançável do corpo perfeito, para que não haja distorção da necessidade da musculação, que, em primeiro lugar, deve ser feita para propiciar mais qualidade de vida. “Um garoto de 10 ou 15 anos não pode acreditar que malhar vai fazer com que fique mais bonito. É uma ilusão perigosa, que pode levar, mais à frente na vida desse jovem, à busca da beleza fácil, por meio de uma suplementação alimentar indevida ou até mesmo do uso de anabolizantes.”

A empresária Fabíola Cury Bokos, 38 anos, orienta constantemente os filhos, Konstantinos, 13, Marina, 11, e Nicole, 6, sobre a importância dos exercícios físicos para a manutenção da saúde. “Eles fazem esportes desde cedo, e o mais velho já está em um programa especial de introdução à musculação”, explica. Konstantinos conta que gosta do ambiente em que malha, com outras pessoas da mesma idade, e da atenção que tem do professor na aula em grupo. “Não somos forçados a cumprir metas absurdas. Cada um faz o que consegue, sem cobrança”, comenta o jovem. Fabíola explica que confia nos exercícios passados ao filho. “Todos entendem que estão aqui para manter o corpo em movimento e saudável, e não para chegar a um ideal de exercícios atléticos.”

Tatiana Jezini, psicoterapeuta infantil, explica que as necessidades psicológicas da criança também devem ser levadas em conta. “O corpo muda muito nessa fase. A autoimagem que eles constroem de si, também. A oportunidade de separar um tempo na semana para priorizar o cuidado com o corpo é importante para que eles saibam mais sobre suas capacidades, limites”, explica a profissional. Segundo Tatiana, diferente do adulto, a criança e o adolescente querem confirmar e compreender as mudanças, não se afirmar bonitos. “A participação dos pais é importante para apoiar a busca por uma vida mais saudável sem a cobrança do ser belo. A criança deve fazer o que gosta e com prazer. A cobrança só atrapalha, aumenta a frustração e a insatisfação do jovem com o próprio corpo.”

FONTE: Correio Braziliense